Pesquisadores da área de antropologia de todo o país terão trabalhos publicados no livro Reflexões Antropológicas sobre as Políticas Públicas, organizado a partir do Colóquio Antropologia e Políticas Públicas, realizado na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) em 2013 pelo Instituto Brasil Plural. A publicação está em fase de revisão na Editora da UFSC e deverá ser lançada após outras duas obras do mesmo grupo, “Políticas Comparadas de Saúde Indígena na America Latina” e “Mulheres e o mar: uma etnografia sobre pescadoras embarcadas na pesca artesanal no Litoral de Santa Catarina”. Elas fazem parte da Coleção Brasil Plural, parceria entre a Editora da UFSC e o Instituto.

As publicações são resultado das pesquisas realizadas no INCT (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia) Brasil Plural, que começou a se estruturar em 2009 com o primeiro edital do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) para formação de INCTs em 2008. Em Santa Catarina, a chamada foi realizada em parceria com a FAPESC (Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina) e teve mais três institutos contemplados: INCoD (Instituto Nacional de Convergência Digital), Polo (Laboratórios de Pesquisa em Refrigeração e Termofísica e CNM (Catálise em Sistemas Moleculares e Nanoestruturados).

Everton Luis Perreira- Fazendo cena na cidade dos mudos
Fazendo cena na cidade dos mudos: Surdez, práticas sociais e uso da língua em uma localidade no sertão do Piauí. (Foto: Everton Luis Perreira, Doutorado em Antropologia, PPGAS. 2013)

Em seis anos, o Brasil Plural teve 152 artigos publicados em periódicos e 267 trabalhos apresentados em eventos científicos nacionais e internacionais. Outros 44 livros foram lançados, além de oito obras de artes visuais. A rede de pesquisa promovida pelo Instituto também contribuiu com a formação de recursos humanos: 35 trabalhos de conclusão de curso de graduação, 90 dissertações de mestrado, 44 teses de doutorado e 12 relatórios de pós-doutorado. Foram realizados dois colóquios, sendo que o segundo recebeu o título Saberes e Ciência Plural, e foi realizado em Manaus (AM), no ano passado. “O financiamento da pesquisa articulada pelo Instituto Brasil Plural promoveu o fortalecimento da rede de pesquisa em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, especialmente na área da Antropologia. Hoje, a rede conta com 60 pesquisadores permanentes e 25 convidados”, diz a coordenadora de projetos da FAPESC, Caroline Seibert.

A rede se estrutura por meio da parceria entre a UFSC e a UFAM (Universidade Federal do Amazonas), visto que o edital previa uma categoria para pesquisas na Amazônia e solicitava parcerias entre instituições das regiões Norte e Sul. A pós-graduação em Antropologia na UFAM era recém-implantada e absorveu diversos pesquisadores da UFSC que se tornaram professores. A ideia dos estudos na Amazônia foi ampliada para Brasil Plural, permitindo pesquisas no Nordeste e Centro-Oeste também. Segundo a coordenadora do Instituto, Esther Jean Langdon, o objetivo agora é expandir a rede para incluir outras universidades da região centro-oeste, como a UnB (Universidade de Brasília) e a UFMT (Universidade Federal do Mato Grosso).

Alguns exemplos de populações estudadas pelo INCT foram as comunidades de mulheres pescadoras no litoral catarinense e no Amazonas; as populações urbanas dos igarapés de Manaus (AM); as comunidades indígenas de Biguaçu (SC); os índios Kaingang da região sul; os guaranis do Arroio Korá, no Mato Grosso do Sul; os índios Ticuna, e remanescentes quilombolas de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O objetivo é dialogar sobre os problemas que atingem essas comunidades e trazê-los a público para causar impacto sobre as políticas públicas, além de dar visibilidade às experiências das comunidades e torná-las conhecidas e reconhecidas. “O importante é subsidiar maneiras com que as instituições públicas possam atender às demandas de maneira adequada, garantindo os direitos e a participação política dessas comunidades, respeitando sua cultura”, afirma a coordenadora do INCT.         

Pesquisadora da área de saúde indígena, Esther explica como esse trabalho pode ser aplicado de maneira prática. Na declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, consta que “os povos indígenas têm direito a seus medicamentos tradicionais e a manter suas práticas de saúde, incluindo a conservação de suas plantas, animais e minerais de interesse vital do ponto de vista médico. As pessoas indígenas têm também direito ao acesso, sem qualquer discriminação, a todos os serviços sociais e de saúde”. Porém, não existe uma preparação do profissional de saúde para trabalhar com grupos culturalmente diferenciados. “Um dos nossos objetivos é fazer pesquisas que contribuam para a formação dos profissionais de saúde”, explica a pesquisadora, “o nosso papel não é ensinar para os indígenas bons hábitos de saúde, mas trabalhar com a questão dos direitos e entender sua relação com o Estado, e também com a ideia de avaliar a política de saúde indígena no país”. 

Segundo Esther, o que o Brasil Plural está praticando é uma Antropologia brasileira, em contato com outros países da América Latina, que pode ser pensada como uma Antropologia da periferia, com preocupações locais que se distinguem de outras antropologias, por exemplo a norte-americana ou a europeia. Os pesquisadores envolvidos querem discutir e apresentar a diversidade de saberes das diversas comunidades em diversas áreas, como direito, saúde, educação e cultura; e mostrar suas práticas do ponto de vista dos próprios membros das populações, rompendo com a dinâmica individualista e particularista da pesquisa antropológica. “A importância de uma rede de antropologia é o compartilhamento de conhecimento e o intercâmbio no modo de fazer ciência, pois não existe uma ciência universal”, resume a pesquisadora.

Por: Jéssica Trombini – Assessoria da FAPESC