Estudo pioneiro desenvolvido na Universidade Comunitária de Chapecó (Unochapecó) propõe tratamento da água de postos de lavação de veículos e apresenta solução eficiente, acessível e capaz de preservar o lençol freático

Texto e fotos por Milena Nandi
Fapesc
milena.nandi@fapesc.sc.gov.br

Em Chapecó, no Oeste catarinense, uma pesquisa brasileira inédita apresenta uma alternativa para o tratamento de efluentes gerados a partir da lavação de veículos. A tese desenvolvida por Marcelo Guerreiro Crizel, para o doutorado do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais (PPGCA), da Universidade Comunitária de Chapecó (Unochapecó), validou o modelo matemático de um reator capaz de oferecer uma solução acessível economicamente, garantindo eficiência e o cumprimento da legislação ambiental vigente.

Bacharel em Química Industrial, em 2013, e mestre em Química, em 2015, pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Crizel faz parte da primeira turma de doutorado do PPGCA da Unochapecó. Ele conta que o projeto surgiu a partir da observação dos serviços de lavagem de veículos no município. “Verifi quei que havia muitos locais de lavagem e tive a impressão de que a água da rampa ia diretamente para cursos d’água. Me interessei em pesquisar algum tipo de tratamento desse efluente líquido, até porque em 2019, quando entrei no doutorado, Chapecó sofria muito com problema de estiagem”.

De acordo com o doutorando, em 2020, havia cerca de 192 mil veículos automotores registrados em Chapecó e, conforme o cadastro da prefeitura, cem estabelecimentos prestavam serviços com características de lavações, em 2019. “Se ao menos for feita uma lavagem de toda a frota por mês, com o uso de água por veículo, que pode variar entre 150 e 600 litros, é possível imaginar o volume de efluente gerado. E o líquido após a lavação tem carga contaminante”, destaca.

Nesse contexto, o pesquisador aponta que o maior agravante é que a maioria dos estabelecimentos não emprega nenhum tipo de tratamento ao efluente gerado, e os poucos que realizam têm um simples processo físico, em caixas separadoras de água e óleo, sendo lançados, geralmente, em riachos e córregos, podendo inclusive contaminar o lençol freático.

Tese da Unochapecó é inédita no Brasil

De acordo com a orientadora da pesquisa, a doutora Josiane Maria Muneron de Mello, a tese desenvolvida na Unochapecó é inédita no país. Além de usar efluentes reais, o projeto utiliza a eletrocoagulação, uma metodologia conhecida no meio científico, mas nunca utilizada no tratamento de resíduos líquidos de postos de lavação.

Além disso, a professora da Unochapecó destaca que boa parte dos estudos realizados nas universidades estrangeiras utilizam efluentes sintéticos, desenvolvidos em laboratórios, e não avaliam todas as condições estudadas por Crizel.

Josiane explica que existem outros processos para tratar resíduos líquidos, sendo o biológico o mais difundido e utilizado. No entanto, têm desvantagens, como a necessidade de uma área maior e de um técnico para operação. “O projeto do Marcelo demanda uma pequena área, é de fácil operação e precisa de pouca manutenção. A maioria dos postos de lavagem são negócios pequenos e se você oferecer uma estação de tratamento cara, a comercialização se torna difícil”, complementa a orientadora da pesquisa.

Esse tipo de efluente, estudado na Unochapecó, apresenta composição complexa e a tese se concentrou em realizar um estudo eletroquímico para reduzir materiais orgânicos; além de surfactantes, como sabão e detergente; e turbidez. Inicialmente, a pesquisa comprovou que a água tratada por eletrocoagulação pode ser direcionada aos cursos d’água sem prejuízo ambiental. No entanto, novos testes ainda devem ser realizados para avaliar a viabilidade de reuso do líquido pelos estabelecimentos.

Estudo em parceria com iniciativa privada

Equipe Completa
Marcelo, a orientadora Josiane de Mello, o coorientador Márcio Fiori e o bolsista Tiago Barreto

A tese chamada Desenvolvimento e Validação de um Reator Eletroquímico para o Tratamento de Efluente de Postos de Lavagem Veicular, que será defendida no segundo semestre de 2023, é um dos exemplos de pesquisas aplicadas desenvolvidas a partir da parceria entre universidades e empresas privadas.

O estudo de Crizel teve apoio da Kemia Tratamentos de Efluentes. A empresa de Chapecó ofereceu equipe técnica, laboratórios para testes em maior escala e o piloto do reator, e forneceu materiais para a construção do equipamento.

A pesquisa contou com a coorientação de Márcio Antônio Fiori, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Os docentes integram o Grupo de Pesquisa de Materiais Multifuncionais, da Unochapecó, que desenvolve estudos em parceria com empresas, a partir de demandas do mercado. A equipe ainda é formada pelo estudante de iniciação científica de Engenharia Química, Tiago Barreto.

A Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc) também contribuiu para o desenvolvimento da pesquisa. Com o valor aprovado de R$ 50 mil, o projeto adquiriu um potenciostato, equipamento que gera a corrente elétrica para o sistema utilizado por Crizel na realização dos testes.